domingo, fevereiro 19, 2012

Fevereiro até aqui

As pessoas fazem um baita marketing desse negócio de entender o mundo pela bondade. Julga-se pelo luto, pela tristeza, julgar a tudo e a todos é fácil, só abrir o Facebook e tudo lá está.
Hoje, eu vou me expor a este julgamento.
Fazendo um rápido balanço desse mês, comecei rompendo o ligamento cruzado do joelho, usaram meu cartão de crédito na internet, clonaram meus cheques, a reforma da casa da minha mãe foi o dobro do esperado (tudo bem, sempre é, né). Estou de molho no carnaval, o que normalmente faço mesmo, mas desta vez esperando a perna dar uma melhorada enquanto avalio se vou operar ou não. Provavelmente não tem jeito. Uma ex namorada deu pequenos peripaques inexplicáveis.
Mas olhando pelo lado bom, estornei as compras indevidas com o cartão, estornei os cheques clonados, tenho alguns bons amigos com que contar, ganhei um PS3 com Skyrim e Fallout 3, tô quase terminando meu tratamento dentário radical e doloroso, tenho uma namorada fogosa que me adora...
E, mais importante, minha avó morreu.
Vamos lá, transeuntes, julguem à vontade. Me olhem feio. Sou abominável, estou em júbilo porque minha avó passou um ano sofrendo e morreu. E acrescento, foi é pouco. Quebrou a perna e passou um ano esperando a pressão regular pra poder operar, não deu, o calcanhar necrosou. E digo, de novo, foi é pouco.
Regularmente, sou ateu. Como qualquer pessoa, tem horas que a coisa enrosca e não dá pra explicar, sinto que tem um poder maior, uma força, não tenho erudição pra explicar, mas parece que às vezes sinto que faz sentido contar com um Deus. Essa é uma hora dessas. Quero que Deus exista, pra que, existindo, tenha criado um Inferno, complexo como os são os pecados dos homens. E nesse apelo desesperado por um além-vida, espero que este tipo de Deus esteja encarando minha avó agora.
Eu tenho certeza que alguns conhecidos, ao ler estas linhas, se escandalizará. Se a estes pobres for dado o hábito da leitura, sugiro que procurem num sebo o romance de Agatha Christie, Cai o Pano. Ou preste muita atenção na descrição factível que Holmes dá de seu arqui-rival Moriarty.
Um inimigo que manipula joguetes para seus crimes, uma entidade por trás do mal, fertilizando a discórdia e as mágoas. Um inimigo de inteligência tão versátil, de domínios tão variegados, que a única assinatura de seus malfeitos é que eles não têm assinatura alguma. Essa era a minha avó.
E para aqueles que ainda se escandalizam com minhas palavras, digo que foi tarde: dois de seus filhos ela conseguiu enterrar, ambos com problemas emocionais tão sérios que, pela tristeza, ou como eu creio, pela torpeza dos atos de outrém, foram levados dessa vida antes da hora. Eu mesmo, que me levantei na última hora tantas vezes da vala de emoções perdidas, poderia ter sido uma terceira alma a cair pela vilania indireta dessa monstra. Minha mãe, primogênita dela, até hoje com o emocional tão abalado que não se sente bem em lugar algum, poderia ter sido mais uma. De uma longa lista.
Falem o que quiser, mas eu sei do que eu vi: uma família numerosa, partida em vários pedaços, calcada em ódio, irmãos se odiando, mães e filhos que não se falam mais até hoje, e aquela criatura lamentável, com um brilho enfeitiçado no olhar, em regozijo, sorrindo, no meio. Vivi com ela, na intimidade, e lembro claramente de ouvi-la por horas se gabando de quem ela tinha deixado colérico naquele dia, ou no outro.
Tenho a mesma inteligência que a dela, talvez não tão desenvolvida, e sei que poderia fazer o mesmo que ela fazia, infernizar os outros só pelo mesmo sentimento que uma criança aleijando um inseto: o poder. Ou a ilusão dele. Não importa, não caí, não me nivelei, e estou aqui dizendo, "vivi, mais que ela, melhor que ela, e sou amado".
Ela que se dane.

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