quinta-feira, dezembro 04, 2014

Reconsiderações

Passei mais ou menos os últimos três anos em grande ansiedade. Engordei, dormi mal, estraguei um joelho, tudo no medo de um porvir que, sinceramente, não tinha idéia do que seria. Ter essa pequena clarividência que eu tenho, assim como meu pai também tinha, é mais um problema do que uma solução. Eu choro términos de namoro e falecimentos meses, às vezes anos antes deles ocorrerem. Comemoro vitórias e presentes antes mesmo de existirem. E na hora em que a premonição vira presente, eu estou lá, de pé, para o que der e vier.
Chorei minha Oma aos dez, carreguei a alça do seu caixão aos treze. Chorei meu pai aos vinte e um, fui carregar seu caixão em Botafogo depois dos trinta, todos os amigos me encarando como se eu não tivesse direito de estar ali. Também não me pegou de surpresa, esse desacato, às vezes parece que eu sou enganado só porque dou mole.
Vi a partida da minha outra avó, a abusiva, enquanto encarava ela. Vi, e com outros dons que temos na família, mostrei o horror da partida. Ela viu, entrou em negação e só foi se lembrar daquilo no seu agonizante leito de morte. Falou meu nome um ano seguido, enquanto dores maiores que a morfina tomavam conta dela.
Eu não ligo se você vai achar esta postagem algo de fantástica. A vida, pela sua mais humilde biologia, já é uma miríade de deslumbramentos e contradições. Eu não preciso inventar que conheço um certo grau de telepatia, clarividência e alguma projeção astral. Muitas vezes, se eu jogar tarô pra você, vai valer a pena me ouvir. E tem dias, afinal, que nada disso dá certo. Fazer o quê?
Tem um tipo de verme que, ao morrer, emite uma luz azulada. Tem um outro bicho que é imortal, só fica renascendo. E tem um tipo especial de animal que acha que pode viver por meio de livros.
Acho que existe um mundo além desse vivenciado pelas leis da física. Não sei como ele funciona, mas sei que funciona. Pude sentir um plano delineado ao meu redor em várias escalas, em diversos momentos, por toda minha vida até aqui. Vi coisas acontecerem comigo e com outras pessoas que só acreditando num plano para que acontecessem desta ou daquela maneira.
Isso quer dizer que eu sou determinista? Não. Só pra começar, mesmo quando a gente vê uma situação, nunca sabemos em que estado de espírito entraremos naquele momento, com aquele acontecimento rolando. Só tenta se colocar na pele do herói de H.G. Wells, em A Máquina do Tempo: incapaz de consertar o passado, ele se condena a assistir inúmeras variações da morte da noiva, impreterivelmente no mesmo horário. No entanto, conforme suas tentativas vão fracassando, ele vai conseguindo, aos poucos, se distanciar da dor de perdê-la para poder finalmente seguir adiante em sua jornada. Ali naquela história, a morte estava determinada, não sabemos se por ter virado passado ou pela determinística; mas o herói, este muda a sua própria ótica para seguir adiante. Para ultrapassar aquele bloco emocional. E então, o restante da história pode acontecer.
Tudo isso só pra te dizer, de novo: você escolhe como vai entrar nos momentos. E isso muda tudo.
Mas voltando ao que estava tentando dizer no começo, a premonição que eu tive era: "Você vai perder tudo que hoje está ao seu redor". Há cerca de três anos.
Cara isso é terrível de se absorver. Mas tem exatamente o mesmo sentimento e efeito que tirar a carta da Morte num jogo de tarô: simplesmente não é nada do que você está pensando.
De fato, tudo que eu tinha ao redor acabou. Endereço, telefone, trabalho, relacionamentos. Tudo.
Hoje eu sou acordado com carinho, e pela mulher mais maravilhosa que eu conheci em toda a minha vida. E não é por me namorar, não. Acho que ela até tá se enrolando comigo. Ela é espetacular por ela mesma. E eu estou começando, finalmente, a sacar quem eu sou. Porque eu simplesmente não vivo mais no terror dos outros. Eu vivo nos meus terrores, e vivo cada um de peito aberto, pra rir um pouco, pra chorar um pouco, e quem sabe, às vezes até mesmo me apavorar. Por mim mesmo.

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Uma vez a gente ficou imaginando que desenho da Disney nos representava. Eu disse que ela com certeza era a Bela, porque adorava ler, ad...