O neurocientista Carl Hart esteve no Brasil em setembro de 2014 e teve menos atenção que o pontapé biomecânico do Nicolelis na abertura da Copa do Mundo da Fifa. Tive interesse em buscar este material, originalmente publicado na AlterNet, pela simples questão que acho conveniente demais que todos os políticos e repórteres seguem a mesma cartilha todo o tempo, e após décadas de violento debate, nem as respostas mudam, nem as abordagens. O povo vive no medo. Ainda por cima, o cara parece o Denzel Washington.O autor de "Um Preço Muito Alto" argumenta que as drogas viraram um bode expiatório fácil para problemas relacionados mais com pobreza e racismo.
Carl Hart acredita que o problema do crack é a pobreza |
Entrelaçada com sua própria história sobre as lutas entre famílias e comunidades estressadas pela falta de capital e poder sobre seus arredores, ele está desenvolvendo novas pesquisas sobre o uso de substâncias. Hart usa sua própria vida e trabalho para revelar que as drogas não são nem de perto tão perigosas quando se pensa. Por exemplo, muitas pessoas usuárias das drogas mais "viciantes" não desenvolvem necessariamente um problema. Aliás, drogas são responsabilizadas por muitos problemas relacionados à pobreza. As políticas que se resultam deste desentendimento são catastroficamente mal orientadas. Kristen Gynne, repórter do AlterNet, falou com Hart sobre sua vida e pesquisa.
Kristen Gynne: Pode nos mencionar algumas das falsas conclusões sobre drogas que você está enfrentando?
Carl Hart: Existem muitas falsas conclusões. Há a crença, por exemplo, de que crack e cocaína são tão viciantes que basta um uso para que o usuário fique preso, e é impossível consumir heroína sem ficar viciado. Também tem outra crença que usuários de meta anfetamina são comprometidos cognitivamente. São mitos perpetuados em primeiro lugar pela manutenção da lei, e a manutenção da lei lida com um grupo limitado e selecionado de pessoas – pessoas que, em muitos casos, se comportam muito mal. Mas generalizar essa conduta para todos os usuários de drogas não é só enxergar mal o problema, ou infantil, é também irresponsável. O impacto desse comportamento irresponsável aterrisa primeiramente nas comunidades negras. Ninguém liga de verdade para comunidades negras, e por isso se permite que esse comportamento continue.
Também é verdade que perdemos várias oportunidades de desafiar nossos conhecimentos básicos sobre drogas. Se as drogas fossem tão daninhas como nós somos levados a crer, uma sociedade de respeito deveria fazer alguma coisa a respeito há muito tempo, para resolver este problema. Mas a verdade é que os próprios conceitos básicos que determinam a nossa política com as drogas está errada e deve ser questionada.
KG: Como a falta de pessoas de cor na academia, ou no processo de pesquisa, afeta nosso entendimento sobre as drogas?
CH: Só para ficar claro, eu não me refiro à pessoas de cor, eu disse pessoas negras, porque pessoas de cor pode-se referir a várias raças diferentes. Estou falando sobre pessoas negras que, como eu, quando voltamos à nossas comunidades e perguntamos sobre pessoas com quem crescemos, a resposta é "bem, ele foi pego com drogas, tá no sistema. Tá pagando uma sentença" ou, "Ah, ele agora tá melhor depois que saiu da cadeia. Não consegue um bom emprego, mas tá se esforçando".
Seria ótimo se tivéssemos cientistas negros, mais pessoas na ciência, para incorporar este tipo de experiências na maneira com que eles pensam e formulam as questões que investigam. O problema é tão homogêneo que questões críticas da nossa comunidade são ignoradas porque não são vistas como importantes.
KG: E como resultado eles não compreendem o próprio ambiente, ou tem outras variáveis que afetam as decisões e comportamento e erram o alvo?
CH: Exatamente. Se você não contextualiza o que está acontecendo com as drogas no país você fica com a impressão que drogas são tão ruins que estão fazendo todas essas pessoas irem presas: "Vamos investigar como as drogas afetam esses horríveis efeitos." Agora, você está ignorando completamente o contexto onde todas essas coisas acontecem, e isso é o que vem acontecendo na ciência. Se você não analisa o contexto, e se você acha que usuários de drogas são ruins, então você desconsidera aquela pessoa que toma conta dos seus filhos, cuida de sua família, trabalha, mas também usa drogas. Se você não pensa sobre todos esses fatores contextuais, você limita seu quadro de análise, e isso é o que temos feito até aqui.
Não é que a ciência minta. Ciência não mente. Mas quando você olha para sua pesquisa com uma visão limitada, você erroneamente tira conclusões sobre drogas, enquanto que outras variáveis que você não compreende ainda estão no jogo.
KG: Você fala sobre as pessoas culparem as drogas, quando esses problemas são ativados pelo stress da pobreza. Tem alguns exemplos?
CH: Eu acho que o crack é o exemplo mais fácil. Nos anos 1980, enquanto eu era adolescente e até os meus vinte e poucos anos, as pessoas – pessoas negras, caras brancos, um grande número pelo país todo – diziam que o crack era tão terrível que as mulheres abriam mão de cuidar dos próprios filhos, e ficou para as avós a missão de criarem mais uma geração de crianças.
Agora, se você olhar para a história em comunidades pobres – minha comunidade, minha família – muito antes do crack entrar em cena, este tipo de coisa aconteceu na minha casa. Fomos criados pela minha avó. Minha mãe foi embora porque ela e meu pai se separaram. Ela foi atrás de melhores empregos e teve de sair do estado, mas não foi só ela. Este tipo de coisa, essa patologia atribuída às drogas, aconteceu com comunidades de imigrantes como os judeus da Europa Oriental quando vieram morar no Lower East Side, mas as pessoas simplesmente passaram a culpar as drogas nos anos 1980 e 1990.
Um outro exemplo é que, desde a era do crack, vários estudos descobriram que os efeitos do crack usado durante a gestação não cria uma epidemia de bebês-crack negros. Ao invés disso, crianças expostas ao crack durante a gravidez cresceram normalmente, e estudos descobriram repetidas vezes que diferenças entre elas e crianças não-expostas não podem ser isoladas dos efeitos sobre a saúde de se crescer pobre e sem um acesso a ambiente estável e plano hospitalar.
Agora, se você olhar para a história em comunidades pobres – minha comunidade, minha família – muito antes do crack entrar em cena, este tipo de coisa aconteceu na minha casa. Fomos criados pela minha avó. Minha mãe foi embora porque ela e meu pai se separaram. Ela foi atrás de melhores empregos e teve de sair do estado, mas não foi só ela. Este tipo de coisa, essa patologia atribuída às drogas, aconteceu com comunidades de imigrantes como os judeus da Europa Oriental quando vieram morar no Lower East Side, mas as pessoas simplesmente passaram a culpar as drogas nos anos 1980 e 1990.
Um outro exemplo é que, desde a era do crack, vários estudos descobriram que os efeitos do crack usado durante a gestação não cria uma epidemia de bebês-crack negros. Ao invés disso, crianças expostas ao crack durante a gravidez cresceram normalmente, e estudos descobriram repetidas vezes que diferenças entre elas e crianças não-expostas não podem ser isoladas dos efeitos sobre a saúde de se crescer pobre e sem um acesso a ambiente estável e plano hospitalar.
KG: E sobre a idéia que drogas podem tornar pessoas em criminosas?
CH: os efeitos farmacológicos das drogas raramente levam ao crime, mas o público aborda a questão dessa maneira independente dos fatos. Se nós formos analisar como drogas farmacológicas influenciam o crime, deveríamos observar o álcool. Sabemos que às vezes as pessoas ficam descontroladas quando bebem, mas com a maioria das pessoas isso não acontece. Certamente, distribuímos milhares de doses de crack e meta-anfetamina para as pessoas no nosso laboratório, e nunca tivemos problemas com violência ou nada deste tipo. Isso indica que não é a farmacologia da droga, mas alguma interação com o ambiente ou condições ambientais, que provavelmente ocorrem sem a droga. Naturalmente, novos mercados de atividade ilegal são muito ou às vezes associados com aumento na violência, ou alguma outra atividade ilegal, mas não é diretamente ligado com as drogas como as pessoas tendem a pensar.
Além do crime, você tem mitos a respeito de drogas causarem incapacidade física, tornarem as pessoas improdutivas para a sociedade, ou destruir famílias. Quando a vasta maioria das pessoas estão usando drogas sem problemas – e uma pequena quantidade de usuários têm problemas – i que isso diz se você estiver pensando criticamente é que não pode ser a droga, ou não pode ser principalmente a droga. Isso te leva a examinar algo sobre situações individuais, condições ambientais, um amplo espectro de fatores.
KG: E sobre o vício? Algumas pessoas que consomem drogas não vão inevitavelmente se tornar dependentes?
Dada a larga percentagem de pessoas que não são viciadas e experimentam essas drogas, é algo além da farmacologia dessas drogas que está causando o vício. Descobrimos por exemplo que 85% das pessoas, por exemplo, que usam cocaína não são viciadas, ainda que usem a mesma substância cosmetológica daquelas que são viciadas. Alguém pode concluir que pode haver uma predisposição biológica nos viciados, mas não há evidência que sustente esta opinião. Com certeza, a idéia tem que ser investigada, mas existe muito mais evidência para sustentar que outras coisas também estão acontecendo na vida das pessoas pré-dispostas ao vício, do que predizer seus vícios antes de outros problemas.
KG Que tipo de fatores ambientais contam?
CH: Bem vamos pensar no uso de drogas. O efeito das drogas é previsível, e algumas drogas são realmente boas em conduzir à euforia e sentimentos de reforço positivo. Agora, se você não tem nada competindo com as drogas para prazer e felicidade, tudo que você tem é privação. Porque você não ficaria doidão?
Se você tiver reforços competitivos ou alternativas, como a capacidade de se prover sustento, desenvolver uma habilidade, ou receber algum respeito baseado em sua performance em qualquer outra coisa, tudo isso concorre contra a conduta potencialmente destrutiva. E então como psicólogo, você só quer ter certeza de que as pessoas tenham uma variedade de reforços em potencial. Se você não tem isso, você aumenta as chances de que as pessoas adotem comportamentos que a sociedade não aprove.
Habilidades que são empregáveis ou vendáveis, educação, ter um patamar ou um papel significativo na sociedade, não ser marginalizado – todas essas coisas são muito importantes.Ao invés de garantir que os membros da sociedade tenham acesso a isso, nossa sociedade culpa às drogas, diz que as drogas são toda a razão para a pessoa não ter uma posição na sociedade, e isso simplesmente não é verdade.
KG: Então se as drogas não são o problema, porque dizemos que são?
CH: Porque elas são um bom bode expiatório. Você pode imaginar se tão poucas pessoas estão envolvidas numa atividade, você pode inventar histórias incríveis sobre essa atividade e ser levado a sério. Isso foi o que aconteceu com as drogas. Note que hoje você não pode inventar histórias incríveis sobre a maconha, mas teve um tempo em que podia: a década de 1930. Isso passou porque muito mais gente experimentou maconha, mas hoje você pode inventar histórias sobre as meta-anfetaminas porque pouca gente usa, ainda.
Bem, eu posso dizer que algumas poucas pessoas realmente sabem que estão usando meta-anfetaminas. Todas essas pessoas que tomam Adderall e outras drogas do mesmo tipo, estão consumindo meta-anfetamina, basicamente. É a anfetamina, e não o "meta" na frente da palavra que cria o efeito.
KG: O que na verdade é responsável pelos problemas comumente ligados às drogas?
CH: Pobreza. E tem as políticas que têm seu papel, também. Políticas como colocar uma larga percentagem dos recursos de manutenção da lei nessas comunidades, então as pessoas quando são acusadas de um crime menor, elas tem uma mancha no currículo que mais tarde diminui a sua chance de se ter uma vida comum, um trabalho decente, essas coisas.
As decisões políticas que tomamos tem um papel muito maior que as drogas em si. Quando eu fiz 14, por exemplo, tinha um programa do governo federal que, visando tirar crianças que nem eu das ruas, nos dava empregos. Sob esses programas, a gente tinha dinheiro pro verão, para se vestir, era bacana. Quando você corta esses programas e as crianças passam a não ter para onde ir, o que você acha que acontece? Não precisa ser cientista pra saber.
Agora nós estamos com esse rapaz de 18 anos, que não tem nada para fazer. Eu estou tentando arrumar um trabalho para ele. Ter um programa federal para crianças menos favorecidas, isso era ótimo. Isso transmite a mensagem de que a sociedade se importa com as crianças terem um futuro. Ensinamos algumas habilidades, ensinamos alguma coisa sobre responsabilidade, garantimos que entre algum dinheiro no bolso deles. Agora se você tira isso tudo deles, perde a chance de ensinar a responsabilidade a eles. Perde a chance de eles colocarem comida na mesa, roupas no corpo.
KG: Em seus agradecimentos, você agradece ao Aid to Families with Dependent Children, que você chama de "bem estar como uma vez soubemos ter."
CH: Toda minha infância, estivemos nos programas de bem-estar social. Minha mãe recebia ajuda para famílias com crianças dependentes – um dos programas de bem-estar social do governo americano. Sem isso, não teríamos subsídios para nossa própria casa. A maior parte da minha infância foi num apartamento com dois quartos, mas aconteceu de nos mudarmos pra um imóvel dos projetos sociais, e ganhamos quatro quartos. Isso foi muito legal.
Ganhamos tickets de alimentos que ajudaram a garantir que tínhamos algo para comer, ainda que pouco. Sem esse programa, eu não teria me desenvolvido fisicamente. Teria ocorrido muito mais estresse no ambiente doméstico.
Agora, a coisa interessante sobre isto é que todos os meus irmãos estavam no programa por causa da minha mãe, e todos os meus irmãos agora têm empregos e são cidadãos responsáveis, pagantes de impostos. Esta história é típica dentro dos programas de governo, mas os conservadores, sob Reagan, começaram a perpetuar essa narrativa da rainha do benefício social, quando na verdade nós sabemos quem são os reis desse benefício: o pessoal da Wall Street. O Governo Federal dá muito mais dinheiro a eles do que às famílias pobres, mas o bem-estar social ficou tão vilipendiado que nos livramos dele.
KG: Como o racismo institucional afeta a política? No seu livro, você mostra como o crack, que é farmacologicamente quase idêntico à cocaína, é punido com uma desproporção de sentenças de 18:1 (e já foi 100:1)* devido à linguagem de racismo codificado ligando a "escória do crack" ao mau comportamento em comunidades pobres e negras. Tem também um relatório recente da ACLU (American Civil Liberties Union, União das Liberdades Civis Americanas) que indica que os negros são em média quatro vezes mais presos por maconha do que brancos.
* Não sei se traduzi bem, o conceito dessa frase me foi inesperado: o texto quer dizer que, para cada ano de condenação por porte de cocaína, tem dezoito anos de sentença para crack em outros processos. Isso é uma meta de redução da disparidade, que já foi de cem anos no crack para cada ano na cocaína. Vale ressaltar que, culturalmente, a cocaína é considerada uma droga de alta sociedade, enquanto o crack é a versão "gueto".
CH: Eu costumo testemunhar como testemunha especialista para ajudar mulheres que usaram maconha durante a gravidez a manterem a guarda de seus filhos. Caso após caso, a ré é uma mulher negra. Seguranças na corte são todos negros; os juízes são todos brancos; e os advogados são jovens e brancos, construindo suas carreiras. É a escravidão toda acontecendo de novo.
Quando você tem um grupo que já é identificado como um "outro", ou um grupo vilipendiado que é minoria, é fácil associar um comportamento para eles. Mas as pessoas não enxergam pessoas negras como sendo completamente humanos. Isso é o que acontece nos US, embora as pessoas não te digam isso.
Porque quando pensamos em Trayvon Martin, quando pensamos em Ramarley Graham, Sean Bell, essas crianças negras que foram mortas nas mãos de algum segurança ou pessoa de manutenção da lei – isso quase nunca acontece com crianças brancas. Se acontecesse, seria uma crise nacional. Mas não é uma crise nacional quando nós já não valorizamos homens e crianças negras da mesma maneira que valorizamos homens e crianças brancas. Nós não vemos eles igualmente.
Eu vejo como as pessoas se comportam, e fica claro. Enquanto você olhar para este grupo desta maneira, vai continuar colocando uma larga percentagem de recursos da manutenção da lei nessas comunidades, mas não muito de maneira a deixá-los melhor. Se você quiser fazer melhorar, dê a essas pessoas empregos. em vez disso, metemos polícia nessas comunidades, fingindo que nos importamos, que fizemos alguma coisa. Mas isso não ajuda.
Enquanto reações das drogas são previsíveis, interações com a polícia não são, e normalmente se tornam mortais. Como pai de um jovem negro, eu prefiro muito mais que meus filhos interajam com as drogas do que com a polícia. Pessoas brancas não precisam pensar nisso. Policiais muito normalmente vêem garotos e jovens negros como menos que humano. Isso cria uma mentalidade onde crianças negras devem "conhecer o seu lugar" e isso afeta sua psiquê. Indignidades se tornam parte de você.
KG: Como a metanfetamina mudou esse discurso?
CH: Metanfetamina é o novo crack. É a mesma coisa que Adderall, mas nós fomos informados que arruína o rosto e os dentes das pessoas. Não há evidência de que a metanfetamina sozinha, contra pouca ou péssima higiene, tornam as pessoas feias. Ao mesmo tempo, porque a maioria das pessoas que usam ou vão presas por metanfetamina são brancas – pobres, claro, pessoas que não gostamos – isso cria uma oportunidade para dizer que a guerra às drogas não é racista.
Em Montana, eles investiram em sentenças alternativas, como um máximo de um ano de sentença junto a tratamento, para usuários de metanfetamina. Você consegue visualizar isso acontecendo com usuários de crack? Claro que não. É interessante porque, com metanfetamina, nós estamos fazendo nosso trabalho, procurar alternativas para ajudar as pessoas. Mas ainda há alguns lugares, como Oklahoma, que ainda estão trancando os brancos.
KG: Em seu livro, parece que você sente alguma culpa por ter sido bem-sucedido, como se abandonasse a sua comunidade. Como sua vida mudou?
Em termos de onde estou agora, eu tenho dinheiro e não tenho que me preocupar com de onde vem minha próxima refeição, então isso é realmente uma coisa boa. Considerando que, quando eu era adolescente, era um dia bom se eu comia duas refeições. Agora, eu espero comer três vezes ao dia, e esse tipo de coisa. Mas quando eu penso por outro lado em família, amigos e este tipo de coisa, era muito melhor antes, porque eu sabia qual era a de todo mundo, você sabia quem podia vigiar sua retaguarda, não tinha que se preocupar com pessoas te apunhalando pelas costas ou tentando te atingir por uma variedade de razões. Na maior parte do tempo, você estava apenas sendo você mesmo – essa é uma coisa que eu carrego do meu passado comigo.
Não importa se eu estou aqui ou lá, eu tenho esse senso de responsabilidade pela comunidade e eu espero carregar isso sempre comigo. Quando isso não estiver comigo mais, talvez esteja na hora de morrer.
KG: Como você navega entre duas culturas diferentes?
CH: Isso é bem difícil, porque eu lido diariamente com a cultura principal (mainstream), e minha família não é muito disso. Peraí, eu não apenas estou na cultura principal, eu estou lidando com essa cultura sendo a porra de um professor na Columbia. Agora, quando eu posso tirar a máscara e ir pra casa, leva uns dias pra me acostumar, ficar OK, não tô mais no poço com os tubarões, eu posso relaxar e relaxar meu vernáculo. E aí tenho que ir embora de novo.
Então, minha família pode ver essa personalidade Columbia, e eles podem tomar isso como um afronta pessoal. Eu me sinto como uma fraude, de vez em quando, em casa, mas isso não tem nada a ver com como eu me sinto com minha família. É só que eu estou pegando pedaços do inferno quando estou no mainstream. No mainstream, eu sou suspeito porque sou preto, tenho dreadlocks, tenho uma barbicha. Quer dizer, eu sou apenas suspeito. Na minha sala de aula na Columbia, eu não sou suspeito porque está claro o que eu estou fazendo, mas eu ainda sou suspeito. E as pessoas são curiosas; elas não sabem que eu tenho os mesmos sonhos e aspirações que elas. Elas acham que eu devo ser diferente de algum jeito.
Esse tipo de problema deve ser um tópico fascinante para pesquisa, particularmente quando pensamos sobre saúde física ou mental, e como elas se manifestam. Mas isso nunca seria aprovado pelo Instituto Nacional de Saúde, porque não é interesse dos pesquisadores brancos. São coisas com as quais tenho que tocar minha vida.
KG: Como esse livro se remete à sua experiência na academia e na América negra?
CH: Eu falo a linguagem dos dois lados. E como resultado, eu acho que ele fala com ambos. E eu espero que no processo, talvez ao longo do caminho, as pessoas que voltam pra casa cuja histórias eu estou tentando compartilhar, se vejam na minha história. E as pessoas no mainstream – eu estou tentando ajudá-las a se ver na minha história.
Em algum momento, eu apenas espero que isso se funda, que eles vejam que não somos todos tão diferentes. Temos as mesmas esperanças, sonhos e aspirações. A expressão desses sonhos e esperanças podem ser ligeiramente diferentes, mas somos bem similares. É isso que eu espero.
KG: Como a política que reflete a realidade deveria ser, e como chegamos até ela?
CH: Isso é complexo, mas muito simples de começar. A primeira coisa é descriminalizar todas as drogas. Mais de 80% das pessoas presas por drogas foram presas por simples posse. Quando você descriminaliza, agora você tem um grande número de pessoas – estamos falando aqui de 1,5 milhão de pessoas presas por ano – que não vão ter mais essa mancha no seu registro. Isso aumenta a chance de essas pessoas conseguirem um emprego, participarem do jogo maior.
Em segundo lugar é aumentar dramaticamente uma educação realística sobre as drogas – nada desse lance de "isto é seu cérebro nas drogas", mas educação de verdade, que tenha mais chance de as pessoas entenderem os efeitos das drogas que elas estão usando, especialmente as que tem efeito medicinal. Não use heroína com outro sedativo porque isso pode aumentar as chances de depressão respiratória. Educação realística, dizendo às pessoas o que fazer, como prevenir efeitos negativos associados às drogas. Já fazemos isso com álcool – você não deve fazer "binge drink" (beber massivas quantidades de álcool em curto período de tempo), não beba de estômago vazio – e deveríamos fazer isso com as demais drogas.
Esta reportagem foi livremente traduzida por mim como um exercício. Não me arrogo de tradutor, assim como gostaria de ser consultado a respeito do uso desta postagem.
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